MPs e Defensorias cobram divulgação mais transparente da gravidade da pandemia no Pará
Governo do Estado está publicando os dados de forma fragmentada e confusa, criticam membros de diversos ramos do Ministério Público e da Defensoria Pública.
Cinco instituições do sistema de Justiça enviaram, na sexta-feira (12), recomendação conjunta à Secretaria de Saúde Pública do Pará (Sespa) cobrando melhorias na divulgação de casos e mortes provocados pelo novo coronavírus, para facilitar que a população entenda a gravidade do estado atual da pandemia.
Ministério Público Federal, Ministério Público do Estado do Pará, Ministério Público do Trabalho, Defensoria Pública da União e Defensoria Pública do Estado recomendam que os dados sejam divulgados de forma abrangente, consolidada e objetiva, e não apenas de forma fragmentada.
Na recomendação, os membros dos MPs e das Defensorias apontam que desde o final de maio os boletins epidemiológicos deixaram de informar o total de novos casos e mortes confirmados na data da publicação de cada boletim, e não foram mais publicados boletins com a soma de todos os dados divulgados no dia.
Em vez disso, nos boletins o governo vem separando os dados de acordo com a data e horário das ocorrências, e não divulga a somatória diária. São publicados boletins apenas com casos e mortes “nas últimas horas”, e casos e óbitos “acontecidos em dias anteriores”.
A recomendação destaca decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), contra a manutenção, pelo Ministério da Saúde, de metodologia semelhante à adotada pela Sespa. No último dia 8, Moraes determinou que o Ministério da Saúde restabelecesse a
divulgação integral dos dados epidemiológicos.
“A Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988, consagrou expressamente o princípio da publicidade como um dos vetores imprescindíveis à Administração Pública, conferindo-lhe absoluta prioridade na gestão administrativa e garantindo pleno acesso às informações a toda a Sociedade”, destacou o ministro do STF na decisão.
Divulgação confusa – Para os MPs e Defensorias, a nova metodologia utilizada pela Sespa é confusa, não tem a menor confiabilidade e apenas se presta a aparentar uma situação menos grave do que realmente é, tendo em vista a falta de testes e a demora na divulgação dos resultados.
Se a população ficar com a impressão que a transmissão da covid-19 está sob controle, esse entendimento equivocado pode estimular o relaxamento das medidas de distanciamento social, alertam procuradores da República, procuradores do Trabalho, promotores de Justiça, e defensores públicos federais e estaduais.
As instituições autoras da recomendação cobraram que voltem a ser divulgados os dados totais de ocorrências confirmadas na data da publicação, e que também seja retomada a divulgação de boletins com a consolidação dos dados publicados no dia.
Assim que receber o documento, a Sespa terá 48 horas para apresentar oficialmente uma resposta. Se a recomendação não for respondida no prazo estabelecido, os MPs e Defensorias podem adotar medidas judiciais.
Desinformação – Ainda na sexta-feira o governo chegou a divulgar que a recomendação havia sido atendida (https://bit.ly/3d3nbTr), mas os membros dos MPs e Defensorias negam, porque as principais cobranças não foram acatadas, como a previsão de divulgação diária do total de novos casos e mortes confirmados na data da publicação de cada boletim e a abstenção de referenciar os casos, para publicação, de acordo com a data do início dos sintomas.
Diferentemente do recomendado, o governo decidiu seguir divulgando os dados exclusivamente com uma separação prévia por data da ocorrência. A única mudança é que antes o governo agrupava como “anteriores” os casos e mortes ocorridos antes das últimas 24 horas, e agora serão agrupados como “anteriores” os casos ocorridos antes dos últimos sete dias, explicam os representantes das instituições autoras da recomendação.
Para os MPs e Defensorias, o método de divulgação permanece, portanto, confuso e não atende a recomendação, que objetiva tornar mais clara e objetiva a informação ao público. Para os autores da recomendação, a divisão por “última semana” traz ainda outros problemas, como o fato de a divulgação levar em conta apenas os novos casos de cada boletim, sem divulgação do total daquela semana. Segundo as instituições que expediram a recomendação, essa é uma fragmentação indevida que, ao invés de esclarecer, traz mais dúvidas à população.
A recomendação não define que deve ser emitido apenas um boletim epidemiológico por dia, como noticiou o governo. Em relação aos boletins parciais, divulgados ao longo do dia, os membros dos MPs e Defensorias não recomendaram que essas publicações sejam extintas. O que foi recomendado é que os dados sejam cumulativos, ou seja, que os novos dados apresentados em cada boletim estejam somados aos dados já divulgados naquele dia, evitando que a fragmentação da divulgação dos dados cause uma compreensão equivocada da realidade.
Assim, adoção dessa forma de divulgação, com dados cumulativos, não exclui a necessidade da publicação de boletim com os dados diários consolidados, frisa a recomendação.
Demais cobranças – MPs e Defensorias também recomendaram que qualquer forma de divisão temporal dos casos confirmados seja esclarecida à população, e que se adote como referência o dia do efetivo diagnóstico, com a especificação do tipo de diagnóstico (clínico ou laboratorial).
Na recomendação, os signatários do documento indicam que a data do início dos sintomas não deve ser considerada como referência para a confirmação dos casos, porque essa forma de contabilização levaria quase todas as notificações a serem divulgadas como “casos anteriores”, já que na maioria dos casos os resultados dos exames só são conhecidos dias depois do aparecimento dos sintomas, e as notificações dos casos dependem da publicação dos resultados dos exames.
Os órgãos signatários da recomendação concluíram, assim, que essa estratégia de vinculação dos casos confirmados à data de início dos sintomas acaba por ocasionar uma permanente “antiguidade” de quase todos os casos divulgados, pois apenas uma ínfima parte é confirmada em seus primeiros dias de sintomas, dando a invariável impressão de redução dos casos nos últimos dias – mesmo que haja crescimento da taxa de contágio.
Em exemplo citado na recomendação, constatou-se que um paciente cuja confirmação da infecção pela covid-19 ocorreu no dia 9 de junho, apesar de cadastrado nesse mesmo dia pela prefeitura, é contabilizado como um caso “subnotificado” de 11 dias atrás, pois o início dos sintomas se deu no dia 29 de maio. Assim, o caso é divulgado como se fosse antigo, apesar de se tratar de um caso recentíssimo, confirmado no próprio dia divulgação, de um paciente com o vírus ativo (capaz de transmissão) e, inclusive, hospitalizado também no próprio dia da confirmação (9 de junho).
Os membros dos MPs e Defensorias incluíram nas recomendações a necessidade de que a divulgação dos casos e óbitos também seja feita de forma regionalizada, conforme as áreas de abrangência das regionais da Sespa, e a importância da elaboração de levantamento dos municípios que não mantém o repasse de informações diárias, para identificação e resolução conjunta das dificuldades existentes.
Por fim, foi recomendada a adoção de medidas para divulgação de informações à população em geral, de forma clara e acessível, sobre os números reais de casos de covid-19 notificados, subnotificados e suspeitos.
Saiba mais – Recomendações são documentos emitidos a órgãos públicos para que cumpram determinados dispositivos constitucionais ou legais. São expedidas para orientar sobre a necessidade de observar as normas e visam a adoção de medidas práticas para sanar questões pelo órgão competente.
Leia a integra da recomendação AQUI.
Ministério Público do Trabalho
Assessoria de Comunicação